Menos é mais: o que o jazz nos ensina sobre diagnóstico?

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Imagine uma balança de pratos como essa mostrada na imagem. No prato do lado esquerdo há dois pesos iguais de 1kg, somando-se 2kg, e no prato do lado direito há somente um peso de 1kg. A balança, portanto, está desequilibrada e para reequilibrá-la você dispõe de pesos de 1kg idênticos àqueles que já estão nos pratos. O que você faria para equilibrá-la? A resposta é simples não é mesmo? Guarde-a por alguns instantes.

Neste momento em que escrevo essas palavras, deixei rolando ao fundo o som de um dos maiores ícones do jazz e da música. Trata-se de um trompetista famoso por mudar o jeito de se tocar jazz ao suavizar harmonias complexas para conquistar ouvintes menos sofisticados. As notas são selecionadas com cuidado e as longas pausas deixam espaços para a música e a banda “respirar”. Esses recursos aterrissaram a visão inovadora do trompetista, que dizia: “Menos é mais”. Seu nome: Miles Davis.

O marcante bordão do jazz player não se restringe somente ao mundo música. No meio digital, é muito comum se pensar em ferramentas complexas, novas funcionalidades, apps e outros recursos rebuscados para se resolver algum problema. Diante disso, departamentos inteiros se mobilizam, desenvolvedores dedicam horas de trabalho e dispende-se grande quantidade de dinheiro e energia para a criação de soluções muitas vezes incríveis… mas frequentemente para o problema errado. Soluções que poderiam ter sido substituídas por alternativas bem mais simples e eficazes, se o diagnóstico do que resolver tivesse sido feito corretamente.

Segundo um estudo de psicologia comportamental publicado na revista Nature no início do mês de abril de 2021 [1], quando nós, seres humanos, nos deparamos com problemas complexos, a tendência é de adicionarmos elementos à solução, ao invés de procurarmos simplificar o problema. No exemplo da balança que citei no início deste texto, qual foi sua resposta? Para reequilibrar os pesos de cada lado, é muito comum as pessoas optarem por adicionar mais 1kg do lado que está com menos peso. Mas não podemos esquecer que existe a alternativa de retirar um peso de 1kg do lado mais pesado, como teria feito o gênio da música Miles Davis.

Em se tratando de problemas do mundo dos negócios, a grande dificuldade encontrada não é em criar soluções, mas descobrir quais são realmente os problemas que precisam ser resolvidos. Normalmente, gasta-se pouquíssimo tempo e esforço fazendo um bom diagnóstico do problema para logo se iniciarem as discussões sobre possíveis soluções. E inevitavelmente o resultado são sugestões que adicionam novas camadas ao problema original ou que envolvem muito mais esforço que o necessário.

Certa vez um condomínio entrou em contato com uma empresa de desenvolvimento de soluções digitais procurando resolver um conflito entre moradores, que alegavam que havia uma “falta de máquinas de lavar” na lavanderia compartilhada. A ideia do condomínio era criar um aplicativo com uma fila virtual para que cada um tivesse a sua vez para lavar suas roupas. O problema teoricamente já havia sido identificado e a solução decidida. Mas antes de sair construindo o app, a empresa de soluções digitais resolveu passar um dia observando o que acontecia na lavanderia. Para surpresa da equipe, na maior parte do dia, a lavanderia parecia ter saído de um filme de faroeste, como se houvesse fenos rolando e nenhuma alma viva passando por perto. Até que no final do dia, cerca de 20:30, uma multidão de gente começou a entupir a sala onde ficavam as máquinas de lavar. Por cerca de duas horas a lavanderia se transformou em um espaço caótico com demanda totalmente desproporcional e depois desse tempo, a paz voltou a reinar. A equipe pensou sobre a questão e chegou a uma conclusão: o que o condomínio precisava não era de um novo app, mas de organizar melhor o fluxo de pessoas na lavanderia. A proposta, na contramão do core business da empresa, foi criar um sistema de recompensas para quem lavasse as roupas fora do horário de pico.

O exemplo da lavanderia ilustra muito bem como um bom diagnóstico pode fazer toda a diferença. Para isso, é essencial analisar os dados disponíveis das mais diversas fontes, tentar observar o problema “com os próprios olhos” e envolver pessoas com históricos diferentes sobre ele. Quanto mais tempo for investido na análise, mais eficaz tende a ser a solução.

Na próxima vez em que você se deparar com um problema, reflita bastante, discuta e verifique se a solução não seria simplificá-lo. Se este for o caminho, tenho certeza de que Miles Davis ficaria orgulhoso.

Tomas Lichfett Machado
Consultor na Zeta Dados

[1] https://www.nature.com/articles/s41586-021-03380-y
[2] Imagem de balança: Venda vetor criado por rawpixel.com – br.freepik.com

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